sexta-feira, 15 de março de 2024

Este texto começa na falha. Deveria começar na falha. Talvez não devesse sequer começar. Mas já começou e irá arrastar-se até não ter mais por onde ir, apesar de que poderá sempre existir um feixe de luz, ali, ao fundo, que lhe dê um novo fôlego.

Talvez ele possa recomeçar, mesmo que aquele capítulo tenha terminado na falha.

Tudo falhou.

{apontamento 39.} 

terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

segunda-feira, 7 de agosto de 2023

Int. 

Noite. Quarto. Calor tórrido. 

Ele está sentado. Tudo começa aqui. Está uma música a tocar. Tudo poderia começar aqui. Tudo poderia começar na música e na imobilidade dele, sentado naquela cadeira a olhar a noite quente pela janela. Tudo poderia começar. Tudo já começou nas gotas de suor que escorrem pelo seu corpo enquanto se mantém imóvel na cadeira. Tudo já começou no ar irrespirável desta noite quente. Tudo poderia começar na música, parece-lhe ser uma música triste, parece-lhe apenas, porque apesar da tristeza que as ondas sonoras lhe fazem sentir, esta música, que poderia começar tudo, dá-lhe algum fôlego na imobilidade. As costas estão suadas, todo o corpo sua. Todo o seu corpo está imóvel. Mas olhando bem tudo realmente poderia começar no subtil movimento do seu dedo. Começou outra música. Outra música ainda mais triste que a anterior. Ele poderia levantar-se e mudar, escolher outra música. Mas é, neste momento a que lhe faz sentido, apesar da tristeza. A tristeza também faz sentido. Não há nada que ele queira neste momento a não ser estar ali, sentado naquela cadeira, a olhar, apenas a olhar. 

Pausa///

Ele está sentado e tudo já começou, apesar da música, apesar do movimento quase invisível do dedo que dobrou ligeiramente, apesar dos pêlos dos braços que se manifestaram quando se arrepiou naquele momento específico da música, aquele momento específico...  O suor escorre, a música continua, a noite não trouxe a aragem fresca necessária, ele mantém-se sentado. Ele poderia tantas coisas. Começa outra música, esta poderá ter o potencial de o fazer chorar. Ele chora. É apenas um piano a tocar. Ele chora. São apenas sons, notas musicais que juntas o fazem chorar. Ele chora. Ele chora apenas. Ele chora no movimento continuo da respiração. Ele chora lágrimas que escorrem de forma continua, não faz nenhum som, vê-se apenas as lagrimas a cair no interior de um quarto de uma noite de verão de calor tórrido. 

A música parou. Não se dá início a outra. Silêncio é o único som audível neste momento. 

Ele pensa: O tempo...

{apontamento 37.}       

segunda-feira, 10 de julho de 2023

int. 

Verão. Tarde. Final de tarde. Calor.

Nada.

Sente uma pequena brisa no corpo.

Arrepia-se.

Está a olhar em frente. A olhar em frente para a janela que mostra a rua. Mas de onde está não consegue ver nada. Ouve duas pessoas a rir. Riem lá fora e as vozes ecoam. 

Continua a olhar em frente. 

Vazio. 

Ouve-se o som alto de um telemóvel. Inclina a cabeça na direção do som. Mexe ligeiramente os dedos das mãos.

Levanta-se. 

Percebe a hipótese de recomeçar. 

Avança. 

Corta para.

{apontamento 36.}  



quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Nunca saltou. Atravessou. Foi atravessando. Por entre, nunca por dentro. Olha-se. Toca nas suas linhas, nem todas têm continuidade. por vezes é necessário apagar a luz. No outro dia, naquela outra hora, no outro momento. A luz do sol tocou-lhe nas linhas do rosto. Deveria cortar para...

{apontamento 35.}


quinta-feira, 13 de janeiro de 2022


Existem momentos de pura felicidade.
Sim, existem! 
A voz e a guitarra. 
A escuta. 
As ondas vibratórias da música.
Eu e o meu irmão.

------------------------

Voz: Tiago Bôto
Guitarra: Rodrigo Bôto
Espetáculo: TOUR DE FORCE FUCK, de Tiago Bôto & Wagner Borges

{apontamento 34.}

quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Volto novamente
a querer alguma coisa.
Encontro-me
novamente
numa intimidade à qual pertencem os meus pensamentos
mais densos.

Porque aceito
que há coisas
que existem.

Existem numa
qualquer função
mesmo que inanimadas.

Observo

E observando
chamo presenças
que aleatoriamente 
se cruzam entre
mim
e o espectro abrangente
da minha observação.

Rapidamente e naturalmente
tudo se diluí,
perdendo os corpos
o magnetismo
que primeiro os juntou.

Aceita-se não saber
e aceita-se viver
a aceitar não saber.

Porque não se SABE nada.

Quais os factos mais concretos?

Eu não sei nada

E atinge-me a agonia de saber não poder
voltar ao grau zero.

O magnetismo da minha
observação abrangente
volta, sem ter essa intenção,
a reunir olhares que pareciam perdidos,
focados num outro campo de magnetismo
que já não era meu e
que da minha presença
parecia que tinham anulado a necessidade.

E então respiro fundo
e cerro o olhar
na vida que me rodeia
e tudo se comprime
e se fecha
num saber mais ou menos ilusório
de que já sabia.

Aborto a expansão
e em seu lugar
instala-se
o nervoso miudinho movimento
do meu corpo
que inicia golfadas de pensamentos
e acelera
provocando-me uma sensação
atroz;
avassaladora
de instabilidade,
onde tudo dá início a um acabar demasiado rápido.

E no acabar
vejo uma oportunidade
de me recompor
e de voltar a mim
iniciando-me numa nova 
expansão
que cruza
aleatoriamente
campos magnéticos
inesperados
e que pareciam já perdidos
mas que renascem
e me impulsionam
para um ritmo lento
que sugo até ao tutano
por ser tão longe de mim
tão desesperadamente longe de mim
que me obriga a SER quando
o alcanço

E SOU por momentos.

{apontamento 33.}

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

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{apontamento 32.}

terça-feira, 29 de junho de 2021

 /pausa/

uma linha de som que atravessa o espaço 

os lábios mexem-se 

os dedos das mãos tocam-se

a cinza cai em cima da mesa limpa

/pausa/

inspirar

expirar

este movimento já começou

não existe nada aqui, apenas a impossibilidade do nada poder ser nada

a linha de som curva-se, diminui, mantém-se suave 

////////// pausa //////////

o corpo volta a sentar-se

está ali parado, não estático

está ali

só ali

só está

{apontamento 31.}


quarta-feira, 21 de outubro de 2020

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Volta sempre às mesmas músicas. Como se fossem vitais, a dado momento, para poder continuar. A música exerce um poder imenso em si. A janela está meio aberta para deixar sair o fumo do cigarro, para se conseguir respirar. As plantas estão regadas, os livros arrumados, as almofadas no sítio. Mas não aguenta mais o barulho, um barulho que penetra os seus dias como um raio fulminante e desvia a atenção do que sente ser essencial. Um barulho que constrange o pensamento, que tira o fôlego e enrouquece a voz. 

Levanta-se. Vai a janela. Respira o ar frio da rua. Olha para a rua vazia. Lá ao fundo o sinal de trânsito emite o som positivo de passagem para os peões. Volta a sentar-se, olha à volta. O chão limpo, o tapete varrido, sente o cheiro químico do detergente que limpou o chão.  Tira as meias, sente necessidade de sentir o chão. Sente frio mas deixa-se estar. Tenta decidir algo que não sabe o que é. O chão está limpo, as almofadas no sítio, os livros arrumados, a janela meio aberta para deixar sair o fumo do cigarro, é necessário respirar, o sinal lá fora emite o som positivo de passagem aos peões. O chão está frio, sente-o. Deixa-se estar.

As luzes estão apagadas.

Deixa-se estar.

{apontamento 28.}    

sábado, 19 de setembro de 2020

As flores estão espalhadas pela casa. Primeira respiração. O chá de perpétuas roxas está em cima da mesa. Segunda respiração. O vizinho do prédio ao lado grita. Terceira respiração. A vizinha de cima caminha com pés de aço. Quarta respiração. As sirenes lá fora. 

Pausa.

Pausa longa.

Ele olha. Suspende a respiração. Mergulha. Ganha tempo, espaço. Espaço para ser. Por agora sem mais palavras, apenas o tempo, o espaço e o silêncio.

{apontamento 27.} 

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Se não fosse as pernas doerem ele levantava-se.
Ao fim e ao cabo elas mexem-se, as pernas. 
Até quando? 

{apontamento 24.}

domingo, 11 de agosto de 2019

Agosto. 
Uma noite de um verão incerto, num mundo incerto, violento, cheio de pedras prontas a ser arremessadas. Ele está sozinho em casa. Ouve-se ao longe a voz da Nina Simone. Ele está embrenhado, aquela voz penetra no mais intimo nas suas ligações corporais. 
Deixa-se ir.
Passam-lhe pela cabeça imagens do passado, presente e de uma qualquer possibilidade de futuro. 
O corpo reage. A música aumenta de intensidade.
Abre a porta de casa, vai até ao quintal e inspira profundamente.
Acende um cigarro.
A lua impõe-se pelo meio de um céu rosado. 
A Nina canta.
O fumo do cigarro inunda o espaço à sua frente até desaparecer. 
Ele continua parado no meio do quintal. 
Subitamente sente uma leve gota de água que lhe toca no braço.
Começa a chover. 
Ele não se mexe.
Olha apenas em frente enquanto se deixa molhar pelas finas gotas de chuva de uma noite de Agosto de um verão incerto, num mundo incerto, violento, cheio de pedras prontas a ser arremessadas. 
Por momentos não sente qualquer dúvida de que era ali que tinha que estar naquele preciso momento.
As finas gotas de chuva deixam de cair.
Ele entra em casa. 
Ouve-se a voz da Nina. 

{apontamento 22.}     

domingo, 5 de maio de 2019







































{apontamento 21.}
Sozinha na mesa de uma esplanada de um café, ela olhava para um lado e para outro na expectativa de algo, de algum acontecimento. Enquanto olhava bebeu um café. Levantou-se, entrou no café e perdeu a mesa onde estava sentada. Regressou com um bolo, sentou-se numa outra mesa.Comeu o bolo com a fisicalidade da espera, da expectativa. Fixou o olhar em frente enquanto fumava um cigarro. Manteve-se à espera enquanto do outro lado da rua as crianças brincavam eufóricas no recreio da escola. 

{apontamento 20.}

segunda-feira, 22 de abril de 2019

Meados de Abril. 
Um cigarro que acompanha o som da chuva. 
O sítio, o espaço ficou silencioso. 
Na viagem de comboio que ele fez a meio do dia reparou num casal. 
A intimidade nos olhares, a tentativa de controlar os impulsos dos corpos, a atracção, a ternura. Os lábios beijaram-se, um beijo demorado, um riso nervoso depois do beijo. Os olhares fixos um no outro. Os corpos a pulsar. Uma mão é acariciada suavemente pelos lábios. Os olhos novamente a penetrar por entre um sorriso de desejo. 
Um corpo que se levanta, pega na mala de viagem, beija novamente os lábios, para, olha, sorri e sai. 
Os outros olhos viraram-se para o exterior da janela de comboio até ao final da viagem.
Fim de caminho.
Ele pega nas suas coisas. 
Sai da carruagem.
Fuma um cigarro e caminha até apanhar um táxi.

{apontamento 19.}    

Este texto começa na falha. Deveria começar na falha. Talvez não devesse sequer começar. Mas já começou e irá arrastar-se até não ter mais p...